DEBILIDADE DA DIAGONAL a2 - g8
Hoje vamos ver como se explora a debilidade da diagonal a2 - g8 (para explorar dos dois lados), quando, por um defeito da abertura, se avança o peão do bispo rei ( f6). Na realidade, AVANÇAR O PEÃO DE f6 DEPOIS DE HAVER FEITO O ROQUE CURTO QUASE SEMPRE É MAU, porque dá origem à debilidade da diagonal antes mencionada. E a partida, por isso só, está perdida quando o adversário ainda conserva seu bispo rei, que há de dominar essa diagonal, por exemplo, desde a casa c4.
De maneira que saber se é bom ou mau fazer f5, veremos em seguida: se o adversário tem o bispo que corre pelas diagonais da mesma cor que a2 - g8 e pode explorar esta debilidade (porque poderia acontecer que esse bispo estivesse encerrado e não pudesse chegar à diagonal mencionada), é indubitável que essa jogada é ruim. A jogada f4 ou f5 deve ser muito bem pensada.
Porém, ainda há mais: suponhamos que já tenha desaparecido o bispo rei do adversário; Ainda assim, resta a Dama, que pode substitui-lo! E quando a Dama pode substituir esse bispo deve-se considerar com muita cautela para não sofrer as conseqüências. Muitas partidas foram perdidas e muitas se perderão unicamente por esse detalhe. Quando se faz, por exemplo, f4 a idéia é fazer jogar a torre de f1 ou, às vezes, cortar a ação do bispo rei contrário contra a casa a2. Porém, então essa diagonal já não interessa, pois o bispo rei passa à outra diagonal (a2 - g8). Daí que, quando em qualquer partida estejamos por jogar f5 (depois do roque curto), devemos levar muito em conta os detalhes e pensar muito no que vem. Claro que às vezes é obrigatório fazer f5 para evitar o mate e não resta outro remédio. O que vamos fazer!
Na partida que reproduziremos ficará bem claro a debilidade que hoje estudaremos. E novamente lhes digo: se até os grandes mestres esquecem desses detalhes, um aficionado também pode cair e fazer f5 sem muito analisar.
BRANCAS: SPIELMANN
NEGRAS: THOMAS
1.d4 e6
A resposta das negras é outra jogada elástica e significa um convite ao branco para variar os planos. Efetivamente, quando as brancas iniciam com e4 e as negras respondem (como agora) e6, entra na conhecida Defesa Francesa, cuja idéia é jogar com um centro atrasado para depois atacar o peão do rei branco mediante d5. Os lances que caracterizam esta defesa são: 1. e4, e6 2. d4, d5, depois do que há várias estratégias.
Aqui as brancas começaram com 1. d4 e a resposta e6 das negras significa que o convidam a jogar 2. e4, entrando em uma Defesa Francesa por transposição de jogadas. Spielman não aceita. Não lhe agrada, pelo que já disse nas lições anteriores muitas vezes: É BOA TÁCTICA NÃO FAZER O GOSTO DO ADVERSÁRIO. DO ADVERSÁRIO PODEMOS ACEITAR OS CONVITES PARA TOMAR CAFÉ, JANTAR OU IR AO CINEMA, ETC. PORÉM, NO TABULEIRO, NÃO DEVEMOS ACEITAR CONVITES. HÁ QUE RECUSAR.
2.c4 Cf6
Vemos que o branco segue obstinado em seu intento: estabeleceu uma abertura peão dama e segue com sua idéia de jogar um gambito de dama. O negro, por sua parte, atrasa o desenvolvimento de seu peão dama. (Pode-se fazer).
3.Cc3 d5
Agora é o branco que convida a entrar em uma defesa Nimzovitsch (3.......Bb4), porém seu adversário não aceitará e entra em um peão dama normal. Sabemos que nesta abertura a situação é difícil de desequilibrar para um ou outro lado, se não houver erros.
Aqui, trata-se de ir dominando casas importantes. Ao contrário, na abertura de peão rei, trata-se de ir logo ao flanco rei e atacar em seguida. Na peão dama, as peças não estão em lugares agressivos; faz-se o jogo posicional.
4.Bg5
A brancas atrasam o desenvolvimento do cavalo rei, reservando-se o direito de tirá-lo pela casa f3 ou por e2. O plano é bom.
4...Cbd7
Já comentamos este lance na lição anterior. Encerra a cilada já demonstrada. Para os teóricos, a dificuldade está em saber se deve fazer-se primeiro Be7 ou Cbd7. A moda de hoje está por Be7. Sua razão é que com Cbd7 facilita-se o jogo das brancas, que poderiam seguir 5. e4; coisa que Be7 não permite. Em troca, Cbd7 tem a vantagem de que as negras ainda não desenvolveram seu bispo rei e, portanto, se reservam o direito de fazer uma Cambridge-Springs, que como dissemos consiste em levar este bispo a b4 e a dama a a5, pressionando sobre o cavalo cravado em c3. Na partida, não acontece assim; as brancas jogam tranqüilamente:
5.e3 c6
Depois disso, pareceria que o negro tem a idéia de jogar uma Cambrigde-Springs; idéia discutível nesta posição, já que não está desenvolvido o cavalo rei branco, que pode sair por e2 e o plano das negras fracassa. Porém o branco não quer complicações. Uma boa maneira de parar a Cambridge-Springs é fazer:
6.cxd5 exd5
Já expliquei que é melhor tomar com o peão de e6 (peão rei negro) do que com o peão de c6. A razão é que facilita às negras a saída de seu bispo dama, que logo jogará perfeitamente bem.
7.Bd3 Be7
As negras renunciam a colocação da Cambridge-Springs, já que as brancas, com Cge2, pararão todas as ameaças.
8.Dc2 0-0
Aqui existe um plano, que se joga hoje em dia, para liquidar está situação. O plano consiste em não fazer o roque, mas jogar: [ 8...Ch5 ao que poderia seguir 9.Bxe7 Dxe7 10.Bxh7 g6 (encerrando o bispo) 11.Bxg6 fxg6 12.Dxg6+ etc. E, como vemos, o branco trocou uma peça por três peões do flanco rei.] Não há, pois, nenhum perigo para o negro em fazer este plano porque: ENQUANTO NÃO SE CHEGUE A UM FINAL CLARO, OS TRÊS PEÕES NÃO COMPENSAM A PEÇA PERDIDA. ESTARIA COMPENSADA SE AINDA RESTASSEM DEBILIDADES A EXPLORAR, DO CONTRÁRIO, A PEÇA VALE MAIS.
É distinta a situação quando se chega a um final puro; por exemplo: um lado com rei e bispo e o outro com rei e três peões; não há nenhuma dúvida de que os três peões valem muito mais do que a peça porque com o bispo somente não se pode dar mate, enquanto que os peões podem ser coroados e ganhar a partida. Por isso, repito, o plano anterior tem certa vitalidade. Porém sigamos com a partida.
9.Ce2 Te8
Observemos que assim se torna forte a pressão do bispo e da dama brancos sobre a casa h7, coisa que com o plano se elimina, para fazer depois g6. Vemos que agora as negras não podiam tirar seu cavalo de f6, por que viria Bxh7+. Para poder fazê-lo, primeiro devem ter movido sua torre a e8 e depois devem colocar o Cd7 em f8.
10.0-0-0
Sabemos que QUANDO SE FAZ O ROQUE GRANDE TENDO O ADVERSÁRIO O ROQUE PEQUENO, SIGNIFICA QUE SE VAI ENTRAR EM UM "DUELO DE MORTE". Os planos do branco são: levar um ataque de peões no flanco rei para destruir o roque. Se não fosse por isso, e porque a posição se presta para tais manobras, o roque grande não seria recomendável. Aqui é possível porque o rei negro está mal colocado e há contra-chances.
10...Ce4
Com a idéia de evitar o que dissemos se faz 10.......Ce4; porém, isto é o início de um plano equivocado. Logo as negras entregam um peão e trocam seu bom bispo da defesa por outro bispo que não trabalha.
11.Bxe4
Se 11.Bxe7 Dxe7 e o cavalo negro de e4 acabará bem defendido e até ameaça um duplo às torres, tomando o peão de f2. Isso foi o que pensou Thomas, porém Spielman não o fará.
A situação é um tanto complicada. Se 11.Cxe4 o indefeso bispo de g4 acaba protegido, mas só pelo momento porque segue 11...dxe4 e se 12.Bxe4 ( se 12.Bxe7 exd3 13.Dxd3 Dxe7 com ganho de peça para o segundo jogador.) 12...Bxg5 13.Bxh7+ Rf8 e as negras trocam dois peões por um bispo. Tampouco serve 11.h4 porque se perde a qualidade com 11...Cxf2]
11...dxe4
Ao não poder tomar o bispo de g5, as negras devem conformar-se em matar o outro bispo. Então, agora é o momento de dar um apoio ao indefeso bispo de g5 com 12. h4 e se Bxg5 13.hxg5,Dxg5 14. Cxe4 e as brancas conseguem abrir a coluna h1-h8 (que é o que querem) para exercer uma forte pressão sobre o roque com a torre e a dama apontando a h7.
12.h4 f5
Chegamos ao momento que desejávamos para esta lição.
As negras, prevendo que depois da troca de bispos não lhes seria fácil defender seu peão avançado de e4, analisam superficialmente a posição e avançam o peão a f5 para dar-lhe apoio. E já se cometeu o erro tão comum que escolhi para o tema de esta lição.
Antes de seguir adiante, vamos fazer outras esclarecimentos sobre esta partida. Com 12.Bf6 tampouco se defendia o peão de e4. E se jogassem 12.....h6 as brancas poderiam estudar a possibilidade de perder o bispo de g5, para abrir a coluna da torre, já que isso dá lugar a uma série de combinações um pouco longas de resumir. De todo o que, se infere que o salto de 10......Ce4 era mau.
Observemos que as brancas carecem do bispo rei, que poderia dominar a diagonal de quadros brancos (a2-g8). Mas tem a dama que pode substitui-lo! O negro conseguiu defender seu peão de e4, porém deixou uma enorme debilidade, que neste caso basta para perder. O negro acredita poder solucionar estes problemas, porém não é isso o que acontece, porque logo vem a dama a tomar essa diagonal e com xeque, com o que ganha mais tempo para o ataque.
Daqui para frente, o negro deverá fazer unicamente jogadas defensivas que, não obstante, serão insuficientes para equilibrar a luta.
13.Db3+ Rh8
Ao não poder cobrir com nenhuma peça, aonde poderia ter ido o rei? Talvez em f8 poderia ter se defendido um pouco mais, já que a pressão da torre de h1 não seria tão decisiva. Porém estamos seguros de que 999 jogadores sobre 1000 teriam feito, por princípios gerais ou por costume Rh8, que foi o que Thomas jogou, sem advertir que existe uma força muito grande na coluna h1-h8, e que a ação da torre, a longo prazo, dará seus frutos. Agora, trata-se de explorar ainda mais a má colocação do rei negro.
14.Cf4
Ameaça-se um salto de cavalo a e6, que seria forte. Porém se agora viesse 14......Bxg5 seguiria 15.Cg6+ (com o que se dá jogo à torre) porque a: hxg6 e 16.hxg5++ (mate). Donde se demonstra, uma vez mais, que A MÁ COLOCAÇÃO DO REI PERMITE COMBINAR E SEMPRE SE ENCONTRARÁ A MANEIRA DE CONTINUAR O ATAQUE.
Observemos que não só o rei está colocado na mesma coluna onde, na outra ponta, está uma torre, senão que também a dama negra está nas mesmas condições, apesar de que existam peças entre elas, que, como sabemos, desaparecerão quando o branco se propuser a isso. Para defender a casa e6 e reforçar h7, faz:
14...Cf6 15.h5
As brancas estão ameaçando mate com 16.Cg6+, hxg6 e 17. hxg6++. A ação da torre sobre o rei é decisiva, enquanto que a dama colocada na diagonal a2-g8 vigia o movimento do rei negro. Não resta mais remédio que não seja cobrir a diagonal dominada pela dama branca. E com o único movimento possível; com o cavalo em d5. No momento, não haverá mate, porém a posição está perdida.
15...Cd5
Como se defende o mate? se joga: 15...h6 que não é bom devido a 16.Df7 hxg5 17.h6 gxf4 18.hxg7# ou qualquer outra combinação parecida, que ganha rapidamente.
16.Bxe7 Cxe7
Não seria bom 16...Dxe7 devido a 17.Cg6+ (duplo) 17...hxg6 18.hxg6+ Rg8 19.Cxd5 etc. Além disso, as negras acreditam que com o movimento da partida impedirão, por agora, 17. Cg6+. Mas, apesar de todo.......
17.Cg6+ Cxg6 18.hxg6 Be6
Finalmente as negras conseguiram cortar a ação da dama na diagonal a2-g8, ainda que demasiado tarde. Com 19.Dxb7 é suficiente para ganhar, porém não se pode dar mate, que é ao que Spielman se propõe, em vista de sua favorável posição. Como não há pressa em retirar a dama porque existe a pressão da torre sobre o rei, faz:
19.Txh7+ Rg8
Única.
20.d5
É esta a jogada lógica porque, enquanto interrompe a ação do bispo, limpará a coluna d1-d8 para que a outra torre logo pressione sobre a dama negra.
20...cxd5 21.Cxd5
E já se conseguiu limpar a coluna d1-d8, que parecia tão fechada. Porém agora as negras aproveitam a debilidade do roque grande, que nesta partida não tem maior importância, mas em outras é tema para explorar.
21...Tc8+ 22.Rb1 Dg5
A dama se desfaz da pressão da torre, ameaçando também tomar o peão de g6. Veremos que isto não resultará suficiente:
23.Tdh1 Dxg6 24.Th8+ Rf7
Única.
25.Dxb7+
E as negras abandonam.