POSIÇÕES APARENTES
Vamos explicar um caso que para os jogadores novos resulta difícil compreender; Quer dizer, difícil de explicar porém fácil de fazer. Esclareçamos: um jogador, em certo momento da partida ACREDITA QUE CHEGOU A UMA POSIÇÃO BOA (e pode ser boa), O JOGADOR SABE QUE É BOA E NO ENTANTO NÃO JOGA COM A PRECISÃO REQUERIDA E PERDE. Parecia-lhe que "já estava ganha" e se jogasse "qualquer coisa" ganhava. Porém faz uma "capivarada" e perde. Depois ouviremos suas lamentações: "Eu estava melhor, fiz uma capivarada e perdi".
Outros, mais impacientes, quando acreditam que estão melhor, lançam-se sobre as posições inimigas e perdem. Destes ouviremos: "eu estava muito melhor, fiz um ataque furioso, vi tudo claramente, mas me equivoquei e perdi". Isto se chama não ter tranqüilidade e se deve à inexperiência. QUANDO SE ESTÁ MELHOR, NÃO SE DEVE ACREDITAR QUE COM "QUALQUER COISA" SE GANHA; deve-se tratar de conseguir o máximo da posição, sabendo que, assim como se obteve a posição melhor, deve seguir pensando para arrematar a partida. Contra essas "capivaradas" não se pode dar regras fixas, porém se pode dar alguns conselhos e estes surgirão da partida que hoje vamos analisar.
Acontece comumente que o aficionado que "está ganho" fique nervoso e faça uma "capivarada" (má jogada). Como se deve fazer para não cair nesse erro? Um dos conselhos seria: NÃO PENSAR QUE "ESTÁ GANHO" E SEGUIR BUSCANDO A MELHOR JOGADA. E outro: CALCULAR NÃO SÓ SEUS PRÓPRIOS MOVIMENTOS, MAS TAMBÉM OS DO ADVERSÁRIO.
Existem muitas posições "aparentes" nas quais quem "ACREDITA" que está melhor não está. Ou, se está, é tão pouca a diferença que não o autoriza a pensar que "está ganha".
A partida que veremos mostra uma dessas "posições aparentes" e foi jogada no torneio de Londres entre os mestres Bogoljubov e Winter, que era campeão inglês nesta época. O primeiro era um jogador muito mais acostumado a grandes torneios, muito mais "cancheiro" que o campeão inglês, e jogou toda a partida com tranqüilidade, pensando que podia superá-lo no momento que achasse oportuno.
BRANCAS: BOGOLJUBOW
NEGRAS: WINTER
1.d4 Cf6
A mais elástica.
2.Cf3
Limita as variantes do negro.
2...e6 3.c4 Bb4+
Bogoljubow preconizava este xeque como o melhor para as negras. Agora lhe tocará refutar seus próprios conselhos. Contra 3......Bb4+ dizia Bogoljubow que o melhor é 4.Bd2; porém não o faz, porque calcula que joga com um rival inferior e deseja metê-lo em variantes que talvez não conheça.
4.Cbd2
Isto se faz com a idéia de atacar, mais adiante, o bispo negro com a3, forçando a troca pelo cavalo. Se o cavalo branco tivesse saído por c3, ao se produzir esta situação, os peões seriam dobrados na coluna do bispo da dama e Bogoljubow quer evitá-lo.
4...b6
O negro prepara um fianchetto de dama, que neste caso não é indicado porque o peão do rei branco ainda não foi movido e, então, as brancas podem opor um fianchetto de rei, que como já sabemos é superior. Porém Bogoljubow não quer jogar "o normal" e faz:
5.a3 Bxd2+
Evidentemente, se 5...Ba5 6.b4 perdendo peça e 5...Be7 perde um tempo. O melhor era trocar, tal como havia previsto Bogoljubow. Com o que se deve tomar este bispo? Descartemos o rei, por razões óbvias. Se o capturamos com o bispo branco 6.Bxd2 Ce4 e teria que trocá-lo pelo cavalo; se 6.Dxd2 Ce4 e perdemos um tempo.
6.Cxd2 Bb7
Evita e4.
7.Dc2
Para fazer e4.
7...d6
Se 7...d5, o caminho do bispo ficaria fechado.
8.b4
Para fazer o fianchetto.
8...0-0 9.Bb2
Natural.
9...c5
Teria sido conveniente primeiro prepará-lo com 9...Cbd7.
10.e3 Cbd7 dxc5
O branco toma o peão do bispo com o peão da dama para abrir a diagonal de seu bispo e para colocar o negro num dilema. Nisto demonstra sua tranqüilidade. SEMPRE QUE SE POSSA COLOCAR O ADVERSÁRIO EM UM DILEMA NÃO SE DEVE PERDER A OPORTUNIDADE. Há que jogar também psicologicamente. Porque se em certo momento há várias jogadas ruins e uma só boa, devemos "obrigar" o adversário a encontrá-la. E se não a encontra... Ao negro se lhe coloca este problema: com o que deve retomar? Descartemos o cavalo. Restam d6 e b6. Sabemos, como regra geral, que se deve tomar com o peão mais distanciado do centro. Porém NO XADREZ NÃO HÁ REGRA FIXA; NÃO SE PODE REDUZIR O XADREZ A PÍLULAS, PORQUE ENTÃO SERIA QUESTÃO DE SE TOMAR A DOSE INDICADA E O JOGADOR GANHARIA TODAS SUAS PARTIDAS. Toda regra tem exceções e este caso é a exceção. HÁ QUE JOGAR SEMPRE PENSANDO E NÃO SUPERESTIMAR NOSSOS CONHECIMENTOS DE TAL OU QUAL REGRA.
11...dxc5
Com esta jogada, restam no flanco da dama 3 peões contra 3. Se 11...bxc5, o peão da casa a7 fica isolado e, com 12.b5, o branco teria 3 peões contra 2 no flanco dama, o que lhe daria uma superioridade que logo poderia aproveitar. Por isso, sempre há que analisar. E agora é ao branco que se lhe coloca um problema: sua vantagem está em que conserva o par de bispos, porém, em troca, seu rival já tem todas as peças desenvolvidas, enquanto ao branco falta desenvolver o bispo rei e rocar. Pode sair este bispo? Analisando-se um pouco, pode-se ver que sim.
12.Bd3 Dc7
Ameaça o futuro roque. Se 12...Bxg2 seguiria 13.Tg1 Bb7 14.Bxh7+ e se 14...Cxh7 15.Txg7+ Rh8 16.Dxh7#.
13.0-0 Ce5
A ninguém se lhe ocorreria trocar o bispo pelo cavalo, porque o par de bispos apontando para o roque adversário é muito forte; não seria negócio trocar um forte bispo por um cavalo. Observemos outra coisa: o roque do negro é um pouco superior ao do branco, porque tem seu cavalo em f6 e as brancas não.
14.Ce4
Não convém 14.Cf3 devido a 14...Cxf3+.
14...Cfg4?
Não seria bom 14...Cxd3 porque segue 15.Cxf6+ gxf6 16.Dxd3 e as negras ficam com peões dobrados na coluna do bispo rei, enquanto as brancas teriam dama e bispo apontando para o roque, com grandes possibilidades de "montar a máquina". Estudemos o que viu Winter. Conforme a resposta das brancas, seguiria : 15.....Cxh2; 16.Rxh2 Cf3+ 17.Rh1 y Dh2++. Se o rei escapa por h3, vem também 17.Dh2+ e o mate se produz poucas jogadas depois. Havia também outra combinação parecida: 15......Cf3+ gxf3 e Dxh2++. Porém Bogoljubow, jogador "cancheiro" e experimentado, viu tudo isto, demasiado simples para um mestre de sua talha e jogou tranqüilo:
15.Cg3
Lógica. Corta a ação da dama em h2 e destrói a combinação,
15...f5
Esta jogada é produto da má apreciação. O negro segue calculando suas próprias jogadas, porém não as do adversário. Correto teria sido Cxd3, porém as negras não querem perder seu ataque. Bogoljubow segue tranqüilo. QUANDO FALTA O CAVALO DE f3 EXISTE UMA MANEIRA DE SUBSTITUÍ-LO DE MANEIRA EFICAZ. (que Lasker praticou muito), E QUE CONSISTE EM COLOCAR OUTRO CAVALO EM f1, onde estará melhor do que em f3 e defenderá a casa h2. Por isso joga sem afobamento.
16.Tfe1 h5 17.Be2
Não se pode jogar 17.Cxh5 devido a 17...Cxd3 18.Dxd3 Dxh2 etc.
17...h4
O branco joga tranqüilo, como se dissesse: "Deixe que venha", enquanto o negro continua obcecado em ganhar por mate. Fez h4 pensando: "Vou lhe destroçar!", porém sem se dar conta de que o cavalo em f1 estará melhor.
18.Cf1 h3
Forçando tudo.
19.gxh3 Dc6
A máquina! Esta era a jogada "chave" que se reservavam as negras; entregariam o cavalo, mas armariam "a máquina", com a qual dariam mate em g2 e h1. Porém as brancas o haviam previsto.
20.e4
A única possível.
20...fxe4
Este é o momento justo em que se rompeu a máquina e se terminou o ataque. Winter havia calculado: 21. f3 a o que seguiria Cxf3, etc. Porém Bogoljubow respondeu:
21.b5!
A jogada intermediária.
21...Dd7
Que remédio?
22.Bxg4 Cxg4 23.hxg4
As negras tem uma peça a menos; estão perdidas. Entretanto, "tiram um lance da cartola".
23...Tf3 24.Te3
Para trocar.
24...Taf8 25.Txf3 exf3
Terminou o ataque.
26.Td1 De7
Ameaçando "entrar" por h4.
27.Dg6
E as negras abandonam. As negras não tem jogada satisfatória e optam por abandonar, antes de seguir uma luta desigual.